Os tributos que compõe o eixo central da tributação sobre o consumo no Brasil responderam, em 2023, por 11,6% do PIB, algo em torno de R$ 1.260 bilhões. E eles serão extintos, sendo PIS, COFINS e IOF-Seguro em 2027[1], com ICMS e ISS deixando de existir a partir de 2033.
Todavia, o ponto principal da Reforma Tributária é a simplificação, com previsão constitucional para manutenção da carga tributária atual, exigindo que esses 11,6% do PIB sejam arrecadados com a cobrança dos novos tributos (IBS, CBS e o IS), além do que sobrar do IPI. Na essência, o valor da arrecadação do IPI (+- R$ 60 bi em 2023) deverá ser coberto pela sobra do próprio IPI + o Imposto Seletivo. E a relevante parcela de R$ 1,2 bi precisará ser coberta pela arrecadação do nosso IVA-DUAL brasileiro, composto por CBS + IBS, o que nos traz a inquietante e reflexiva pergunta: qual alíquota padrão será necessária para manter a atual carga tributária?
O Ministério da Fazenda – MF explica que, na medida em que os tributos atuais forem sendo eliminados, as alíquotas de referência (padrão) do IBS e da CBS deverão ser calibradas para repor a exata perda da arrecadação, após deduzir os ganhos de receita do Imposto Seletivo. Essas alíquotas de referência serão fixadas e revisadas anualmente por Resolução do Senado Federal, com base em cálculos realizados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e que deverão considerar os efeitos sobre a arrecadação de quaisquer tratamentos diferenciados que resultem em arrecadação diferente daquela que seria obtida com a alíquota de referência (padrão).
A projeção inicial do MF informava que a alíquota de referência do nosso IVA-DUAL (CBS + IBS) poderia ficar na faixa de 20%, se fosse aplicada alíquota única para todos os produtos e serviços. Contudo, após considerar todos os ajustes, incluindo os regimes diferenciados (redução de alíquota em 30% para profissionais liberais e de 60% para educação, saúde e outros itens) e os regimes específicos (combustíveis, imóveis, hotéis, transporte de passageiros, plano de saúde, bares, restaurantes e outros), que terão modelo de cálculo diferente do regime regular, o MF chegou a alíquota estimada em 26,5%, cujo estudo foi apresentado em conjunto com o PLP nº 68/2024, que chegou no final de abril ao congresso nacional.
Após novas reduções incluídas no texto aprovado na Câmara em julho de 2024, inclusive a polêmica inclusão da proteína animal na cesta básica nacional, foi realizado recálculo da alíquota provável a ser aplicada ao combo CBS + IBS, que aumentou para quase 28% (27,97% para ser mais exato), conforme nota técnica divulgada pelo Ministério da Fazenda. O acréscimo estimado de 1,47% na alíquota padrão de 26,5% pode ser explicado por:
a) Inclusão da proteína animal na cesta básica – 0,56%
b) Redesenho do regime específico de bens imóveis – 0,27%
c) Inclusão dos queijos na cesta básica – 0,13%
d) Recuperação de créditos para imunidades (serviços de radiodifusão/imagens, livros, jornais e periódicos) – 0,13%
e) Ampliação dos medicamentos na alíquota reduzida – 0,12%
f) Demais alimentos incluídos em alíquotas menores (sal, farinhas, aveia, óleos de milho e babaçu, pão de forma, plantas e flores etc.) – 0,10%
g) Outros ajustes – 0,16%
QUAIS PRODUTOS, SERVIÇOS E ATIVIDADES TERÃO APLICAÇÃO DA ALÍQUOTA PADRÃO
Normalmente são apresentados os segmentos que foram enquadrados nos regimes diferenciados (com redução de alíquota) ou específicos (com modelo diferente de apuração). Porém, é importante descrever a relação (não exaustiva) do grupo de produtos, serviços e atividades que terão cobrança integral de IBS + CBS e que irão suportar a alíquota padrão dos novos tributos. São eles:
a) Alimentos industrializados (exceto margarina, farinhas, aveias e alguns outros);
b) Armas, fogos e munições;
c) Bens de informática:
d) Equipamentos esportivos;
e) Itens de higiene, beleza e cosméticos e produtos de limpeza em geral;
f) Móveis, eletrodomésticos, joias e relógios;
g) Materiais de construção, quadros e obras de arte;
h) Partes, peças e acessórios de veículos;
i) Produtos para Pets e animais;
j) Roupas e calçados;
k) Academias;
l) Água e esgoto, gás e energia;
m) Cursos e treinamentos em geral;
n) Manutenção em geral;
o) Passagens aéreas, serviços de catering e bufê;
p) Telecomunicações, streaming e prestação de serviços em geral; e
q) Produtos com imposto seletivo (aeronaves, embarcações, bebidas alcóolicas e açucaradas, concurso de prognósticos e “fantasy games”, produtos Fumígenos e veículos).
A TRAVA NA ALÍQ. PROPOSTA NO PLP 68/24 E A NOVA PROJEÇÃO DE 28% NA ALIQ. PADRÃO
A transparência é fundamental no processo de reforma tributária. É importante compreender que qualquer redução de alíquota para um segmento, uma atividade específica ou um produto/serviço precisará ter cobertura do conjunto da sociedade, especificamente naqueles bens e serviços que não foram contemplados com regimes diferenciados ou específicos.
O artigo 465 (§ 11, II) do PLP nº 68/24 aprovado na câmara dos deputados definiu que a alíquota máxima seria de 26,5%, colocando uma trava e direcionando para a revisão quinquenal prevista para março de 2031 que, caso essa alíquota de 26,5% não fosse suficiente para cobrir a manutenção da carga tributária em 2033, seriam ajustados os regimes diferenciados ou específicos², de forma linear ou diferenciada por setor. Assim, se a alíquota de 26,5% projetasse uma arrecadação a menor em R$ 80 bi, esse valor precisaria ser coberto com ajuste nas alíquotas diferenciadas. Por exemplo, o redutor poderia ser ajustado de 60% para 55%, 50%, o que aumentaria os tributos sobre bens e serviços como educação, saúde, medicamentos e outros.
O PLP nº 68/24 continua em debate na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, com previsão de votação apenas na primeira quinzena de novembro de 2024. A nota técnica da RFB estimando a alíquota padrão em 28% certamente suscitará um debate mais qualificado no congresso, com participação dos representantes da sociedade. Há grupos de interesse em diversos segmentos reclamando que a reforma tributária aumentará sua tributação, prejudicando sensivelmente os negócios e com potencial para onerar o preço desses bens e serviços. O direcionamento sobre quem vai pagar a conta pela inclusão de novos itens nas alíquotas reduzidas é muito importante e precisará ser alocado a um dos dois grupos:
Vamos acompanhar a evolução do debate e as cenas dos próximos capítulos.
[1] O IPI será desidratado em 2027, sendo cobrado apenas para produtos fabricados fora da Zona Franca de Manaus, mas nos casos de terem fabricação lá.
Fonte: Itamaraty Contabilidade