Neste mês de março de 2021, o Mercosul completa 30 anos. O Tratado de Assunção, que constituiu o mercado comum, foi assinado pelos presidentes dos quatro países formadores do bloco em 26/03/1991. Naquela ocasião, os discursos ufanistas de sempre mencionavam que começávamos a escrever nossa própria modernidade ou que a formação do bloco propiciaria economias de escala e otimizaria vantagens comparativas, dentre outras expectativas otimistas, porém, não é o que se vê decorridas três décadas. Na verdade, a iniciativa de conformação de um mercado comum muito pouco acrescentou em termos de evolução e desenvolvimento econômico local.
Para consolidar o Mercosul ao que foi previsto no Tratado de Assunção existe ainda muito a ser feito, inclusive no próprio contexto comercial. Em virtude do tempo decorrido desde sua implementação e as evoluções em nível global relativamente aos patamares de tarifa aplicáveis às importações, a revisão da TEC, por exemplo, vem sendo, cada vez mais, considerada uma prioridade. Assim, além das falhas intrínsecas ao próprio processo de integração, a situação das economias nacionais, a necessidade de mais intercâmbio com novos mercados, bem como as prioridades específicas de cada membro geraram, com o passar dos anos, reflexos pouco animadores no comércio intrabloco.
Preliminarmente, é importante informar que as transações com a Argentina, nesse intervalo de 30 anos, corresponderam a 76% do comércio do Brasil com o Mercosul (72,4% na exportação brasileira e 80% na importação brasileira de produtos do bloco).
Pode-se afirmar que o Mercosul foi um sucesso de 1990 (quando foi firmada a Ata para estabelecimento do mercado comum) até 1998 (período de cinco anos anteriores e apenas quatro posteriores à conversão em união aduaneira em janeiro de 1995): nesse intervalo de tempo, o comércio do Brasil com os demais países do Mercosul cresceu 408% contra um aumento de 109% da comercialização brasileira em escala global, fazendo com que os outros três países do bloco passassem a responder por 16,8% do comércio exterior brasileiro naquele ano, percentual jamais alcançado posteriormente.
Desde então, a participação caiu sensivelmente até 2002, mantendo depois uma certa estabilidade, entre 9 a 10%, até 2017, porém, nos últimos três anos, entrou em novo processo continuo de queda. Cabe destacar que, em 1990, a participação do Mercosul no comércio exterior brasileiro foi de 7%, enquanto que, em 2019, caiu a nível inferior (6,9%), recuando mais ainda para 6,2% em 2020, ou seja, por se tratar de número relativo, nem se pode dizer que a pandemia possa ter sido a única culpada por isso porque houve queda sim do valor comercializado externamente pelo Brasil, mas a queda do comércio no Mercosul foi bem mais intensa.
Se um dos argumentos para a conformação de acordos e de outras políticas de integração na América do Sul era a de que os países do continente se posicionavam física e comercialmente de costas uns para os outros, 2020 serviu para mostrar que, lamentavelmente, sob o ângulo comercial, os países integrantes do Mercosul nem no período de negociação estiveram tão distantes comercialmente falando, isto é, estão mais de costas um para o outro do que nunca se considerarmos os resultados numéricos, nada obstante os discursos frequentemente entusiastas das autoridades de seus membros.
Outro aspecto importantíssimo a destacar é que o comércio brasileiro com o Mercosul, historicamente, é o que apresenta a maior participação de produtos manufaturados na comparação com as transações com os demais blocos econômicos e continentes, mais uma vez confirmando o velho ditado do aqui se faz aqui se paga, em que menos comércio exterior de produtos de maior valor agregado explica em grande parte níveis relevantes de desemprego e pobreza nos países membros.
Enquanto isso, a China ocupou paulatinamente os espaços vazios ou, melhor dizendo, esvaziados pela falta de sintonia, coesão e por que não dizer também de evolução tecnológica, por meio de investimentos externos e desenvolvimento do capital humano. Hoje a China é, de forma disparada, o maior parceiro comercial do Brasil, tendo se tornado ainda, em 2020, o maior fornecedor de mercadorias ao mercado argentino, assumindo um lugar que pertenceu ao Brasil durante décadas. O lado mais cruel da história do comércio da China com o Mercosul é o que se pode denominar versão mais moderna de colonialismo, em que se as trocas se dão com a China comprando matérias primas e vendendo produtos de muito maior valor agregado.
Os membros do Mercosul precisam, imediatamente, aprofundar a integração regional, passando por cima das tensões comerciais e do aumento do protecionismo que têm ocorrido nos últimos anos, para poderem enfrentar em melhores condições de barganha o cenário internacional que se apresenta mais complexo a cada dia. É preciso ter em mente que a missão do Mercosul nunca foi a de oferecer proteção para seus membros, mas sim a de melhorar suas condições para a competição em âmbito global.
Autor(a): JOSÉ MANOEL CORTIÑAS LOPEZ
Mestre em Economia Empresarial e Engenheiro – Especialista em Normas, Procedimentos, Logística e Financiamento de Comércio Exterior – Conselheiro Técnico da AEB – Associação de Comércio Exterior do Brasil – Autor dos livros (mais de 10.000 exemplares vendidos): Comércio Exterior Competitivo; Os Custos Logísticos do Comércio Exterior Brasileiro; Siscomex Exportação; e Exportação Brasileira: A Real Participação das Empresas – Ex Assessor Especial da Camex – Câmara de Comércio Exterior do Conselho do Governo Federal – Ex Coordenador Geral da Secex – Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. (Parceria com Marilza Gama – Mestre em Administração e Desenvolvimento Empresarial)
FONTE : Aduaneiras